Homilia na Missa do Crisma - 28 março 2018

Homilia na Missa do Crisma - 28 março 2018

POSTADO EM 02 de Abril de 2018

HOMILIA

     “...Vós, porém, sois uma raça escolhida, um sacerdócio régio, uma nação santa, um povo adquirido para Deus, a fim de que publiqueis as virtudes daquele que das trevas vos chamou à sua luz maravilhosa. Vós que outrora não éreis seu povo, mas agora sois o povo de Deus; vós que outrora não tínheis alcançado misericórdia (Os 2,25), mas agora alcançastes misericórdia” (1Pd 2, 9-10).

    Caríssimos irmãos presbíteros, diáconos, religiosos, religiosas, seminaristas, representantes leigos e leigas de nossas paróquias, coordenadores de comunidades, atividades pastorais e evangelizadoras, movimentos e grupos presentes em nossa Igreja Mãe para a Missa do Crisma.

    A Eucaristia que hoje celebramos, sob a presidência do Bispo, copresidência dos presbíteros e participação ativa, piedosa e frutuosa dos fiéis leigos e leigas, por força do batismo, reaviva e impulsiona a todos ser e a viver o que somos: um só corpo, formado por muitos membros, que em Cristo se edifica e dá a unidade verdadeira para que sejamos reconhecidos como povo eleito de Deus.

    Queremos, nesta solene liturgia, com a bênção dos óleos e consagração do Crisma, contemplar e agradecer uma vez mais, com alegria, nossa identidade de povo sacerdotal que na Santíssima Trindade encontra a sua própria fonte, que se revela e autocomunica aos homens e mulheres em Cristo, constituindo, nele e por meio do Espírito, a Igreja como gérmen e início do Reino... (PdV, 12).

    É no interior do mistério da Igreja, como comunhão trinitária e em convocação missionária, que se revela a identidade cristã de cada fiel leigo e leiga e a específica identidade do sacerdote e do seu ministério.

    Irmãos e Irmãs, somos um povo de consagrados, “consagrados na verdade” (Jo 17,19), consagrados para servir, a exemplo de nosso Mestre e Senhor, Jesus Cristo. O presbítero, o padre, o sacerdote é um consagrado, "configurado a Cristo” pelo sacramentos do batismo e da ordem. Essa configuração não é uma realidade externa a nós, mas realidade ontológica, que pertence ao nosso ser, é aquilo que somos, nossa identidade.

    É a partir dessa configuração, que tudo em nós se explica, encontra sentido e se expressa não como dominação, mas como serviço. E como a Igreja, a humanidade inteira, nesta hora dramática pela qual passa, precisa do nosso serviço: fidelidade, santidade, alegria, comunhão, obediência, obediência humilde até a cruz.    

    Em meio a tal realidade é que seremos reconhecidos, conforme nos recorda o Apostolo Paulo, como “dispensadores dos Mistérios de Deus” (1 Cor 4,1), realidade tão sábia e tão inculta, tão poderosa e tão frágil, tão religiosa e tão descomprometida com o Projeto de Deus. É aí que anunciamos Jesus Cristo, nós que nos tornamos um com ele. Não falamos de nós mesmos, não anunciamos ou projetamos a nós mesmos, mas somos chamados a nos doarmos,  preocupando-nos com os homens e as mulheres, longe e perto de nós, em suas necessidades urgentes: os famintos, os doentes, os sem abrigo, atingidos pela indiferença, preconceito, violência.

    Seja fundamental na nossa vida o zelus animarum, expressão que caracteriza a pessoa toda, por inteiro, com corpo e alma, destinada à eternidade. Só com a consciência dessa pertença, consagração e configuração a Cristo é que poderemos ser felizes, realizar em nossa vida o “Mistério de Cristo” do qual somos dispensadores.

    Busquemos, eu peço, nas possibilidades e nos limites, viver como um corpo, solidários, irmãos de verdade, e como família sacerdotal, que necessariamente passa pela experiência da diocesaneidade – relação entre nós, presbíteros com o Bispo, e com os irmãos fiéis leigos e leigas.

    Por ocasião do encontro com presbíteros, religiosos, seminaristas e diáconos permanentes, em Bolonha, no dia 1º de outubro de 2017, o Papa afirmou que na diocesaneidade se fundam a nossa espiritualidade, nosso equilíbrio emocional, a nossa alegria, a nossa serenidade. Cuidemos, portanto, da nossa diocesaneidade. O isolamento, a indiferença para com os irmãos e a Diocese, as inúmeras tarefas sem organização e planejamento, muitas delas caducas, podem nos fazer adoecer, nos destruir.

    Manifesto aqui minha gratidão aos presbíteros que, para além de suas preocupações pessoais e paroquiais estão verdadeiramente comprometidos com a Igreja Diocesana, acolhendo irmãos presbíteros em suas necessidades, partilhando do seu ministério e ajuda material, amando-a para que possa servir sempre mais e melhor.

    Aos irmãos leigos e leigas, sobretudo neste ano do laicato, renovamos nosso apreço e consideração. “Configurados a Cristo pelo Batismo”, “consagrados”, eles são “sujeito eclesial” – sujeito na Igreja, “embaixadores de Cristo”, com a cidadania própria do povo de Deus. Eles são participantes por direito da missão da Igreja, com um lugar insubstituível no anúncio e serviço do Evangelho. Não podem ficar fora da verdadeira comunhão, entre si e com os seus pastores, o que gera liberdade e corresponsabilidade, para vivência na liberdade, autonomia e sadia relacionalidade. 

    Quantos aos irmãos e irmãs de vida consagrada, também eles configurados a Cristo, são chamados a tornar visíveis as maravilhas que Deus realiza na frágil humanidade das pessoas chamadas. Mais do que palavras, testemunham essas maravilhas com a linguagem de uma existência transfigurada no segmento de Jesus, pobre e casto, eterno sacerdote.

    Nas suas diversas formas, monástica, apostólica e secular, a vida consagrada é um dom de Deus e uma especial participação na função profética de Cristo, comunicada pelo Espírito a todo o povo de Deus. A história missionária e martirial dos consagrados e das consagradas, vivida como Família Religiosa, Ordem, Congregação e Instituto, honra e fecunda a Igreja e desperta o mundo para a alegria do Evangelho. O Papa Francisco, que é também um consagrado, assim disse: “...estar na contemplação com Jesus, único Senhor da vida dos consagrados e consagradas, forma para um olhar contemplativo da história, e os ajuda a discernir nela a presença do Espírito de Deus, para viver o tempo como o tempo de Deus...”

    Aos nossos seminaristas, também configurados a Cristo, consagrados pelo batismo, a Igreja pede que o itinerário do processo formativo – vida no seminário, seja marcado:

1. encontro com Jesus Cristo – olhos fixos nele para não descuidar do convite diário: segue-me;

2.  conversão – modelar a vida e o modo de pensar a partir de Jesus Cristo Crucificado, morrendo com ele cada dia, sobretudo para o pecado, para nele alcançar a salvação;

3. buscar o discipulado – deixar-se formar na escola de Jesus para atingir a personalidade dele;

4. exercício diário para a comunhão –  “a Igreja necessita de sacerdotes e consagrados que nunca percam a consciência de serem discípulos em comunhão”;

5. a missão, sempre inseparável do discipulado –  desde o tempo de formação, o verdadeiro seminarista tem o coração aberto para anunciar Jesus, morto e ressuscitado até os confins do mundo;

6. vida interior, fiel à espiritualidade centrada em Jesus Cristo, cuidando desde já para não se entregar à mundanidade espiritual, que já entrou na Igreja e tomou conta de muitos leigos e leigas, religiosos e religiosas, padres e Bispos... Que seminaristas e presbíteros cuidem com a obsessão pela aparência, com a segurança doutrinal ou disciplinar presunçosa, o narcisismo e o autoritarismo, a pretensão de impor-se, o cuidado somente exterior e ostentação na vida litúrgica, a vanglória, o individualismo, a incapacidade para escutar o outro e, sobretudo, todo gênero de carreirismo.

    Como povo sacerdotal, confiemo-nos a Maria, mãe de Jesus, nossa mãe e gloriosa padroeira.  Ela, em sua pobreza, humildade, obediência, acolheu e colaborou com o seu sim na realização do Projeto amoroso de Deus – o Reino da Vida. No discípulo amado, ao pé da cruz, Jesus exultou por todos os que iriam aceitar o seu chamado e disse a Maria: “Eis aí o teu filho” (Jo 19,26). Naquele discípulo, os discípulos – missionários de ontem, de hoje e de sempre.

    Com toda a Igreja, apresentemo-nos sempre mais como povo de Deus reunido na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

+ Sérgio

Bispo Diocesano

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