REFLETINDO SOBRE AS INDULGÊNCIAS

REFLETINDO SOBRE AS INDULGÊNCIAS

POSTADO EM 04 de Dezembro de 2015


Image title

Costuma-se dizer (brincando) que o grande “azar” do cristianismo foi ter sido tornado religião oficial do Império Romano. O imperador Constantino, no início do século IV, assim determinou. A Igreja deixou de ser perseguida. Apoiada nas estruturas do Império começou a organizar-se. E ninguém desconhece: a sua extraordinária força de avanço e de estruturação capilar teve a experiência prática da organização imperial.   Consequência prática: para ser agradável ao imperador era importante converter-se à “nova religião”. E muitos dos potentados, nobres, senhores de terra, etc. “converteram-se” porque as circunstâncias assim o exigiam. Não é difícil entender porque cada região, cada cidade, cada reino queria ter um santo. E, naturalmente, as suas relíquias. Isso seria garantia de prestígio e... poder. Daí, a proliferação de relíquias. E não é preciso fazer grande análise para perceber que, naqueles tempos, não era tão fácil garantir a veracidade de tudo o que se afirmava. Convém recordar sempre que a análise histórica exige, para ser eticamente correta, que tenhamos em mente os parâmetros das diferentes épocas. Não para justificar o que aconteceu. É para poder compreender porque aconteceu. Feitas estas observações, passo a segunda vertente que originou o surgimento das indulgências: a práxis penitencial da Igreja. Os primeiros cristãos logo se confrontaram com as questões dos desvios pessoais em relação à fé que professavam e para a qual se tinham convertido. O que acontecia àquele que pecava? Converter-se a Cristo, fazer parte da Igreja e agir contrário à fé era gravíssimo! Haveria perdão? O que o pecador deveria fazer? A história da evolução do Sacramento da Penitência é interessantíssima. Existiram tendências de todo tipo. Desde as que achavam que tendo pecado não havia nenhum jeito na terra de obter o perdão até os que propunham as mais variadas atitudes penitencias. Que podiam durar anos. A pessoa era afastada do convívio eclesial e depois, tendo dado provas de arrependimento e conversão, passando por rito penitencial público, era reintegrada. Com o passar do tempo começou a surgir a prática de comutar penas temporais longas por alguma prática que abreviasse o tempo, mas não perdesse a característica do rigor da penitência a ser feita. Daí surge o que costumamos chamar de “penitência tarifada”, isto é, estabelecia-se para determinado pecado uma prática que substituiria o prazo em que o pecador deveria ficar afastado da comunidade. De tal modo que não havia afastamento, mas a pessoa devia cumprir a penalidade imposta (romarias, jejuns, esmolas, orações). É neste contexto que, nos primórdios do século XI, começam a surgir os primeiros testemunhos sobre as indulgências. Diante de um pecado cometido e que acarretaria uma determinada penalidade, a pessoa poderia fazer determinada ação que compensaria o rigor daquilo que seria imposto. Façamos um exemplo: um adúltero deveria passar vinte anos afastado da Igreja, fazendo penitência pública. Para que ele não corresse o risco que nos vinte anos afastado a situação ficasse ainda pior, o afastamento era transformado em fazer uma romaria até um grande santuário. Lá seria submetido ao ritual penitencial, receberia a comunhão, e sairia perdoado (claro está que não estão excluídas as providências a serem tomadas em relação a possíveis danos causados).  Convém lembrar que a confissão perdoava (e perdoa) o delito, mas, com o disse no artigo anterior, o pecador fica com o dever de manifestar, de alguma forma, uma satisfação que se materializa num gesto, numa atitude de reparação. Repito, como disse anteriormente, que está é uma necessidade que brota dentro de cada um. Penso que todo mundo já passou por uma situação de ter que pedir perdão, desculpas e, posteriormente, sentiu-se na obrigação de fazer algum gesto que preenchesse, de alguma forma, a atitude incorreta. Não esqueçamos que somos todos de carne e osso. As indulgências são, pois, um modo de cumprir uma obrigação moral que temos como dever de amor diante de Deus e da Igreja (entendida, na expressão de São Paulo, como corpo místico de Cristo). O meu pecado ofende ao amor de Deus e ofende aos meus irmãos e irmãs. Sou perdoado, mas devo reparação. Seria muito simplório pedir perdão e não sentir-se na obrigação de manifestar a alegria pelo perdão com alguma atitude reparadora. Continuaremos a reflexão sobre esta riqueza que são as indulgências.

© Copyright 2024. Desenvolvido por Cúria Online do Brasil