V Dia Mundial dos Pobres “Sempre tereis pobres entre vós” (Mc 14, 7)

V Dia Mundial dos Pobres “Sempre tereis pobres entre vós” (Mc 14, 7)

POSTADO EM 17 de Novembro de 2021

Por ocasião do V Dia Mundial dos Pobres o Papa Francisco escreveu uma mensagem, e aqui, pretendemos demonstrar o quão importante é aprofundar a reflexão acerca da opção preferencial pelos pobres. Inicia a mensagem oferecendo uma fundamentação bíblica sobre a pronúncia destas palavras de Jesus: “Sempre tereis pobres entre vós” (Mc 14, 7). Comenta o Papa, que o evangelista narra a entrada da mulher “anônima” com o vaso de alabastro cheio de perfume muito precioso e que ela derrama sobre a cabeça de Jesus na casa de Simão, “o leproso”.

            Segundo o Papa, desta situação foram feitas duas interpretações. A primeira é a indignação dos presentes, com o “desperdício” do perfume que seria melhor vender aos pobres, pois custava o valor de 300 denários (o equivalente a um salário anual do trabalhador) e a segunda dada pelo próprio Jesus que permite a mulher individuar o sentido profundo do gesto realizado por ela. Em relação a primeira interpretação o Papa faz menção a um texto de Orígenes que diz: “Judas, aparentemente, estava preocupado com os pobres . (...) Se, agora, ainda houver alguém que tem a bolsa da Igreja e fala a favor dos pobres como Judas, mas tira o que metem lá dentro, então tenha parte diretamente com Judas” (Comentário ao Evangelho de Mateus 11, 9)”. (FRANCISCO, 2021).

            Quanto a interpretação do gesto da mulher, reconhece o Papa:


Jesus sabe que está próxima a sua morte e vê, naquele gesto, a antecipação da unção do seu corpo sem vida antes de ser colocado no sepulcro. Esta visão ultrapassa todas as expectativas dos convivas. Jesus recorda-lhes que Ele é o primeiro pobre, o mais pobre entre os pobres, porque os representa a todos. E é também em nome dos pobres, das pessoas abandonadas, marginalizadas e discriminadas que o Filho de Deus aceita o gesto daquela mulher. Esta, com a sua sensibilidade feminina, demonstra ser a única que compreendeu o estado de espírito do Senhor. Esta mulher anônima - talvez por isso destinada a representar todo o universo feminino que, no decurso dos séculos, não terá voz e sofrerá violências -, inaugura a significativa presença de mulheres que participam no momento culminante da vida de Cristo: a sua crucifixão, morte e sepultura e a sua aparição como Ressuscitado. As mulheres, tantas vezes discriminadas e mantidas ao largo dos postos de responsabilidade, nas páginas do Evangelho são, pelo contrário, protagonistas na história da revelação. E é eloquente a frase conclusiva de Jesus, que associa esta mulher à grande missão evangelizadora:” Em verdade vos digo: em qualquer parte do mundo onde for proclamado o Evangelho, há de contar-se também, em sua memória, o que ela fez” (Mc 14, 9). (FRANCISCO, 2021).


                Com esta explicação quer afirmar o Papa Francisco que “Esta forte “empatia” entre Jesus e a mulher e o modo como Ele interpreta a sua unção, em contraste com a visão escandalizada de Judas e dos outros, inaugura  um fecundo caminho de reflexão sobre o laço indivisível que existe entre Jesus, os pobres e o anúncio do Evangelho”. (FRANCISCO, 2021).

O rosto que Jesus revela, segundo o Papa: “O rosto de Deus que Ele revela é o de um Pai dos pobres e próximo dos pobres”. O Papa Francisco afirma que os pobres nos evangelizam porque nos permitem descobrir os traços mais genuínos do rosto do Pai, “eles têm muito a nos ensinar”, além de participar do “sensus fidei”, nas suas próprias dores, conhecem Cristo sofredor. (Cf. FRANCISCO, 2021).

Jesus não só está do lado dos pobres, mas também “partilha com eles” a mesma sorte. Os pobres não pessoas “externas” à comunidade, mas irmãos e irmãs cujo sofrimento se partilha, para abrandar o seu mal e a marginalização, a fim de lhes ser devolvida a dignidade perdida e garantida a necessária inclusão social. (Cf. FRANCISCO, 2021).

Sobre a diferença em dar esmola e a partilha, explica o Papa Francisco:


Aliás sabe-se que um gesto de beneficência pressupõe um benfeitor e um beneficiado, enquanto a partilha gera fraternidade. A esmola é ocasional, ao passo que a partilha é duradoura. A primeira corre o risco de gratificar quem a dá e humilhar quem a recebe, enquanto a segunda reforça a solidariedade e cria as premissas necessárias para alcançar a justiça. Enfim, os crentes, quando querem ver Jesus em pessoa e tocá-Lo com a mão, sabem aonde dirigir-se : os pobres são sacramento de Cristo, representam a sua pessoa e apontam para Ele. (FRANCISCO, 2021).



                Em seguida traz o testemunho do Pe. Damião que viveu na ilha de Molokai e convivendo com os leprosos “viveu e morreu com eles”. Diz o Papa: “Com grande generosidade, respondeu à vocação e ir para a ilha de Molokai - tinha-se tornado um gueto acessível apenas aos leprosos -, a fim de viver e morrer com eles” (FRANCISCO, 2021). Considerando o momento atual de pandemia, compreende que “O seu testemunho é muito atual nestes dias, marcados pela pandemia do coronavírus: com certeza a graça de Deus está em ação no coração de muitas pessoas que, sem dar nas vistas, se gastam concretamente partilhando a sorte dos mais pobres”. (FRANCISCO, 2021).

            Convida o Papa Francisco à termos plena convicção do convite do Senhor: “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1, 15). Esta conversão, consiste, primeiro, em abrir o nosso coração para as múltiplas expressões de pobreza e, depois, em manifestar o Reino de Deus através de um estilo de vida coerente com a fé que professamos. (Cf. FRANCISCO, 2021). O Papa pede que estejamos atentos as “novas formas de pobreza” produzidas pelo sistema econômico que além de considerar os pobres responsáveis pela sua condição, “(...) constituem também um peso intolerável para um sistema econômico que coloca no centro o interesse de algumas categorias privilegiadas”. (FRANCISCO, 2021).

            O estilo de vida individualista é cúmplice na geração de pobreza. Afirma o Papa: “Um estilo de vida individualista é cúmplice na geração da pobreza e, muitas vezes, descarregam sobre os pobres toda a responsabilidade da sua condição. Mas a pobreza não é fruto do destino; é consequência do egoísmo. Portanto, é decisivo dar vida a processos de desenvolvimento onde se valorizem as capacidades de todos, para que a complementaridade das competências e a diversidade das funções conduzam a um recurso comum de participação”. (FRANCISCO, 2021).

            Impõe-se “uma abordagem diferente da pobreza”. E segundo, o Papa Francisco: “É um desafio que os governos e as instituições mundiais precisam de perfilar, com um modelo social clarividente, capaz de enfrentar as novas formas de pobreza que invadem o mundo e marcarão de maneira decisiva as próximas décadas Se os pobres são colocados à margem, como se fossem os culpados da sua condição, então o próprio conceito de democracia é posto em crise e fracassa toda e qualquer política social”. (FRANCISCO, 2021).

            Retomando o sentido das palavras escolhidas para este V Dia Mundial dos Pobres diz o Papa Francisco que “Sempre tereis pobres entre vós” (Mc 14, 7) é um convite a não perder jamais de vista a oportunidade que se nos oferece para fazer o bem. É decisivo aumentar a sensibilidade para se compreender as exigências dos pobres, sempre em mutação por força das condições de vida. A assistência imediata para acorrer às necessidades dos pobres não deve impedir de ser clarividente para atuar novos sinais de amor e da caridade cristã como resposta às novas formas de pobreza que experimenta hoje a humanidade. (Cf. FRANCISCO, 2021).

            A mensagem para o V Dia Mundial dos Pobres termina com votos do Papa Francisco: “Faço votos de que o Dia Mundial dos Pobres, chegado já à sua quinta celebração, possa radicar-se cada vez mais nas nossas Igrejas locais e abrir-se a um movimento de evangelização que, em primeira instância, encontre os pobres lá onde estão. Não podemos ficar à espera  que batam à nossa porta; é urgente ir ter com eles às suas casas, aos hospitais e casas de assistência, à estrada e aos cantos escuros onde, por vezes, se escondem, aos centros de refúgio e de acolhimento…É importante compreender como se sentem, o que estão a passar e quais os desejos que têm no coração”. (FRANCISCO, 2021)


Pe. José Antonio Boareto

Referência bibliográfica FRANCISCO. Mensagem do Santo Padre Francisco para o V Dia Mundial dos Pobres, 2021. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/messages/poveri/documents/20210613-messaggio-v-giornatamondiale-poveri-2021.html. 


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